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terça-feira, 24 de novembro de 2015

Estrelas para que te quero!

Recentemente (Setembro de 2015) foram revistos os diplomas que regulam a oferta turística nacional. Em 3 de Setembro foi publicado o Decreto-Lei nº 186/2015 que introduz alterações ao Regime Jurídico dos Empreendimentos Turísticos (RJET) e em 25 de Setembro foi publicada a Portaria nº 309/2015 que regulamenta o sistema de classificação dos empreendimentos turísticos.

No RJET, verificamos uma preocupação significativa relativamente ao Turismo nas áreas integradas no Sistema Nacional de Áreas Classificadas (SNAC) com base na revisão em curso do Programa Nacional de Turismo da Natureza. Estas alterações demonstram uma preocupação com a criação de regras claras e objectivas para a fruição turística destas área que não podemos deixar de louvar.

Outra das preocupações prende-se com a desburocratização dos processos de licenciamento, preocupação esta que tem norteado este ciclo legislativo que se iniciou em 2008. Efectivamente, este diploma promove “(...) uma maior eficiência, simplificação e liberalização nos procedimentos administrativos” o que também é de louvar.

Este diploma vem, ainda, clarificar o mecanismo de dispensa de atribuição de categoria de alguns empreendimentos turísticos (hotéis, aldeamentos e apartamentos), já introduzida em 2014, e segundo o qual os interessados poderão solicitar esta dispensa ao Turismo de Portugal.

Se as duas primeiras referências aqui expressas, são realmente dignas de registo e a sua aceitação pacífica, já a última nos merece alguns comentários.

Se analisarmos a Portaria acima referenciada sobre o sistema de classificação dos estabelecimentos hoteleiros, aldeamentos e apartamentos turísticos, verificamos que os promotores destes empreendimentos podem pedir a dispensa de atribuição da classificação do empreendimento mediante o cumprimento dos requisitos obrigatórios mínimos e opcionais que garantam a atribuição de 3, 4 ou 5 estrelas para os hotéis e 4 ou 5 estrelas para os aldeamentos e apartamentos turísticos e desde que 20 % da pontuação obtida por via de requisitos opcionais resulte do cumprimento de requisitos constantes na secção 5 – Qualidade e Sustentabilidade dos respectivos anexos da referida Portaria.

Recuando um pouco no tempo, constatamos que a classificação dos empreendimentos turísticos surge em 1970 com a aprovação do primeiro regulamento da, então chamada, industria hoteleira. Desde essa altura que em todo o mundo os hotéis e demais formas de alojamento turístico são associados a uma classificação por estrelas. Bem ou mal, o mercado habituou-se a catalogar estes estabelecimentos face ao número de estrelas e criou nessa base o seu próprio padrão de qualidade. Dada a universalidade destes critérios, os padrões criados tornaram-se também universais, embora com algumas excepções que apenas confirmam as regras. Quem procura um alojamento em qualquer parte do mundo quer saber a sua classificação. E a sua escolha baseia-se normalmente neste critério ou pelo menos será o primeiro critério de selecção.

E agora? Quando se pretender escolher um hotel em Portugal, deparamo-nos com unidades sem categoria expressa ou seja, deparamo-nos, por exemplo, com uma unidade hoteleira “Hotel XPTO” mas sem qualquer referência à sua classificação. Como irá reagir o consumidor? Ignora ou tentará saber a sua classificação? Vai pelas aparências ou irá ligar para o hotel a saber “mais”? Se tem outro hotel classificado ao lado, qual irá escolher?

Confesso a minha ignorância, mas efectivamente não consigo descortinar qual o objectivo desta medida. Nem mesmo a simplificação administrativa me responde a esta questão, uma vez que, salvo melhor opinião, a unidade será sempre objecto de uma auditoria de classificação, quanto mais não seja para avaliar o cumprimento ou não dos requisitos de dispensa da mesma. Retirar informação ao consumidor é sempre mau e nem mesmo a implementação de estratégias de marketing ou outras me convencem.

Sinceramente, gostava de perceber!

Um outro aspecto prende-se com a obrigatoriedade de as Pousadas passarem a cumprir os requisitos para hotéis de 3 estrelas quando instaladas em edifícios classificados de interesse municipal ou em edifícios de reconhecido interesse arquitectónico, histórico ou cultural e de 4 estrelas quando instaladas em edifícios classificados como de interesse nacional ou público.

As Pousadas de Portugal foram criadas para promover o turismo, a gastronomia e o bom acolhimento do povo português, sendo a primeira, a Pousada de Elvas, inaugurada em Abril de 1942. E assim foi até 1976 data da criação da ENATUR – EP. Com a Enatur, as Pousadas passaram a ser exploradas segundo critérios de pura rentabilidade, alterando profundamente a forma de exploração mas mantendo as suas especificidades de continuarem a promover o Turismo Português. Este critério acabou por ser alterado com a privatização da ENATUR em 2003 e a partir daí, as Pousadas foram perdendo gradualmente os seus paradigmas e forma, perdendo qualidade pela imposição de critérios de rentabilidade muito duros. Este nivelamento por baixo (3 e 4 estrelas) será certamente a última machadada neste tipo de unidades, deitando por terra um trabalho 73 anos a bem do Turismo Nacional.

Para quando o fim das Pousadas? Deixo esta pergunta no ar!

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Por Rui Soares Franco
ruioreysfranco@hotmail.com
Consultor em Turismo e Hotelaria

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