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terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Exclusividade mas não tanto!

Como é sabido, as principais mediadoras imobiliárias tendem a impor aos clientes a contratação em regime de exclusividade.

Entendemos, contudo, que tanto os mediadores, em geral, como o público, em particular, têm uma ideia errada da abrangência dessa exclusividade.

Concretizando:

A exclusividade prende-se essencialmente com a promoção do negócio -  durante o período estipulado no contrato (3, 6 meses) o cliente não pode contratar outro mediador, nem pode ele próprio promover a venda do imóvel (anunciando-o ou praticando outros actos de divulgação).

Com esse escopo, a exclusividade significa também que, durante o período contratado, caso o mediador apresente ao cliente um comprador que aceite as condições de venda previamente estipulados por aquele, se o cliente não aceitar a celebração do negócio fica ainda assim obrigado a pagar a comissão à mediadora nos mesmos termos em que seria devida se o negócio fosse concretizado.

No entanto - e aqui está o detalhe que muita gente não sabe - o cliente é livre de, durante o período de exclusividade, celebrar o negócio com terceiro que não lhe tenha sido apresentado pela mediadora, sendo que, nesse caso, esta não tem direito a qualquer comissão.

Era já esse o entendimento da jurisprudência dos tribunais superiores sobre este assunto, concretizado neste acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20/4/2010. E muito recentemente, no passado dia 5/11/2015, o Tribunal da Relação de Évora veio pronunciar-se no mesmo sentido, solidificando essa linha de interpretação jurisprudencial.

Em ambos os casos os clientes, durante o período de exclusividade contratada com as respectivas mediadoras, venderam o imóvel objecto do negócio a um terceiro que não lhes fora apresentado pelas referidas mediadoras. E em ambos os casos os tribunais entenderam que não era devida qualquer comissão.

Acrescente-se, como curiosidade, que, no caso mais recente - em que mediadora era a Century 21 – ficou mesmo assente, em primeira instância, que o cliente teria pretendido cessar o contrato antes do termo acordado com a intenção de ludibriar a mediadora, deixando de lhe pagar a comissão que, no seu entender, lhe seria devida.

Vejamos o que a lei (de mediação imobiliária) estabelece a este respeito:

“Artigo 18.º (Remuneração)
1 - A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação. 
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior: 
a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração; 
(…)”

“Artigo 19.º (Contrato de mediação imobiliária)
(…)
4 - Quando a empresa de mediação é contratada em regime de exclusividade, só ela tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência. 
5 - A consagração do regime de exclusividade, quando exista, terá de constar expressamente do contrato de mediação imobiliária.” 
(…)”

Exemplo de cláusula de exclusividade num contrato da Remax

Face ao disposto na lei - e nestes contratos - poder-se-ia entender que, caso o cliente, durante o período de vigência do contrato em regime de exclusividade, procedesse à venda do imóvel objecto do contrato a um terceiro, esta sua actuação seria reconduzível ao previsto no referido art. 18.º, n.º 2 al. a), ou seja, que estaria, com a sua actuação, a tornar impossível o negócio visado, pelo que seria devida a comissão ao agente mediador.

Contudo, em ambos os casos acima vistos, tanto os tribunais de primeira instância, como os tribunais da Relação, entenderam precisamente o contrário.

Transcrevemos, abaixo, as conclusões dos referidos acórdãos:

Relativamente ao âmbito do referido art. 18.º, n.º 2 al. a) 

“visa os casos em que a mediadora haja apresentado ao comitente um interessado no negócio, nas condições acordadas, não se concluindo este por acto do cliente daquela” – Relação de Guimarães – “Ou seja, têm de se encontrar reunidas todas as condições para a celebração efectiva do negócio e este não se venha a formalizar em virtude da recusa do cliente” – Relação de Évora;

Relativamente à comissão não ser devida nos casos em apreço

“(…) o comitente não pode diligenciar no sentido de angariar, por si, interessados no negócio, mas não fica inibido de aceitar qualquer proposta que lhe seja apresentada por algum que espontaneamente se lhe dirija” –Relação de Guimarães; e

“No contrato de mediação imobiliária o alcance da norma do nº 4 do art. 19º do Dec. Lei 211/2004, de 20/08, em conjugação com a norma do art. 18º, nº 2, al. a), do mesmo diploma legal, não afasta a possibilidade do comitente aceitar negócio que directamente lhe for proposto por interessado não angariado pela mediador” – Relação de Évora.

É importante, assim, que, tanto mediadoras como proprietários tenham a correcta noção da abrangência da exclusividade.

Os mediadores para nunca descansarem, confiando no tempo assegurado pelo contrato em regime de exclusividade a par do poder de divulgação do respectivo site da internet, deixando assim de promover activamente todos os contactos com interessados. Que tenham sempre presente a faculdade dos clientes de, tomando conhecimento do imóvel através de qualquer via (que pode mesmo passar pelo portal de internet da mediadora em causa, uma vez que o nexo de causalidade entre o anúncio e o interessado dificilmente se poderá provar), poderem entrar directamente em contacto com o vendedor e ajustar a compra, sem comissões de mediação.

E os proprietários para que não deixem de aceitar negociar com todos os interessados que os abordem directamente, sem intervenção da mediadora, uma vez que, caso celebrem o negócio com estes, não terão de pagar a comissão à mediadora.

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Por Francisco Silva Carvalho
Advogado

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